terça-feira, 6 de maio de 2008

VULTOS DE ESPOSENDE

Álvaro Vilas Boas Pinheiro,

Por: Artur L. Costa

Um dos intelectuais mais activo nos primórdios do século XX, que muito contribuiu para o desenvolvimento da cultura, em Esposende, foi em nossa opinião, Álvaro Vilas Boas Pinheiro, também ele, o mais esquecido de todos os vultos do seu tempo.

- Origens do Poeta ; entre Fão e Valença

O Vulto em destaque, desta vez, é neto de fangueiro: José Francisco dos Santos, filho de Manuel Joaquim Pinheiro da Silva, também natural de Fão e 2º oficial da Alfândega de Viana do Castelo, mas “estacionado no porto de Esposende”, natural de Valença, pela mãe.

Álvaro Vilas Boas Pinheiro nasceu na rua Direita (hoje a 1º de Dezembro), aos 5 de Fevereiro de 1872, pertenceu aos Quadros da Função Pública, prestou serviços na Delegação Escolar de Esposende, dirigida pelo genro, Carlos de Oliveira Martins; casado com Maria das Dores da Costa Leitão Pinheiro, natural de Valença. Faleceu, em 11 de Março de 1947, quando vivia com a filha, a Prof. Maria Emília.

Um Poeta esquecido

Manuel de Boaventura, na revista que assinalou o 4º centenário do Foral de Esposende, publicada em Agosto de 1972, dedicou uma página a Álvaro Pinheiro, “Um Poeta de Esposende”, transcrevendo o melhor e mais significativo poema da sua vasta obra literária. Disse, então: “Álvaro Pinheiro deixou no seu espólio literário sete ou oito volumes de poesia, está por completo esquecido e nada o rememora, nenhum cunhal menciona o seu nome”. E mais: “A obra do Poeta é cântico perene à sua gente”. Para completar o elogio ao amigo e poeta do seu tempo, acrescentou: “Afigura-se-nos de inteira justiça raspar algumas placas de cunhal e numa delas afixar o nome deste esposendense que foi inspirado poeta e arreigado bairrista”.

- Seguidor de João de Deus

Entre 1895 e 1935, Álvaro Pinheiro publicou as seguintes obras: Sonâncias(três edições); Amores Perfeitos ; Nenúfares; Pétalas (duas edições); Longes; Sons da Montanha e Humorismos. De pétalas saiu uma terceira edição, acrescida de novas composições. Ficaram, no entanto, por se publicar: poemas Intimo e Meus Cuidados; Traços, livro de prosa, Contos e pontos; foi o autor da letra do hino a Rodrigues Sampaio, em 1906, com música de João de Freitas.

Seguidor da Escola de João de Deus, viveu intensamente o período do romantismo, muito em voga entre o século XVIII e XIX por influência da escola de França, com Lamartine e Victor Hugo, enquanto em Portugal, Garret, Herculano e Camilo foram os grandes impulsionadores deste estilo literário e artístico. Aliás, na opinião de Manuel de Boaventura, Álvaro Pinheiro “foi único poeta lírico do nosso concelho”. Era todo “punhos de renda, segundo a época. Usou o pseudónimo “João do Minho”. Os seus livros estão esgotados.”

- Poeta lírico e de estilo romântico

Dispomos, por deferência da Biblioteca Municipal de Barcelos, extractos de duas obras: Humorismos, publicado em 1935; Sons da Montanha, publicado em 1921, sobre Santa Luzia e a cidade de Viana do Castelo, alguns poemas de “Amores Perfeitos” com dedicatória do autor a seus pais e a João de Deus, o seu poeta. Será oportuno esclarecer que tais obras depositadas na Biblioteca Municipal de Barcelos, foram oferecidas à Escola Primária Superior de Barcelos que, por sua vez, faz doação à Biblioteca. José da Silva Vieira ofereceu “Pétalas” à referida Escola, depois da sua publicação.

Para se fazer uma ideia do estilo literário de Álvaro Pinheiro, uma das três filhas, a Celeste, em 20 de Outubro de 1907, numa festa da escola primária, declamou alguns dos seu poemas, de que transcrevemos:

Para valer à pobreza,

Nem só de pão há a esmola…

Há o saber – que é riqueza;

Ide crianças, à Escola.

Ainda, de Manuel de Boaventura, citamos : Álvaro Pinheiro, distinto e admirado poeta, nado e criado na virgiliánia Ribeira Cávado, acalentado e inspirado pelas Celânides que logo ao nascer o bafejaram de talento, vai esta mostra do seu estro e da sua ternura pela Família:

No meu jardim há três rosas

Cheias de graça e frescor

Lindas, singelas, mimosas

Cuidadas com todo o amor.

Ando sempre a venerá-las,

Com receio de perdê-las,

E horas e horas a olhá-las

Nunca me canso de vê-las.

Deus as preserve do mal

No seu modesto canteiro,

Que as rosas do meu rosal

São filhas do jardineiro.

Álvaro Pinheiro, esposendense por nascimento (de certidão passada), era figura muito popular, tendo colaborado em “O Novo Cávado”, em 1919 e no “Esposendense” entre outros jornais e revistas, dedicou muito do seu ideário à terra onde criou e floresceu a família. Colaborou intensamente na imprensa regional e nacional e as suas obras, desde longa data esgotadas, não mereceram algum nova edição. Como disse Manuel de Boaventura: “para se rememorar entre os conterrâneos”.

Também o escritor e jornalista portuense, Júlio de Lemos, dedicou alguns textos em memória de Álvaro Pinheiro, afinal, companheiros de lutas e de canseiras, com muita dedicação à literatura. Depois da morte de José da silva Vieira, na homenagem prestada pelos amigos e companheiros nas letras, coube a Álvaro Pinheiro “desvendar” os simpáticos atropelos dos seus correligionários progressistas locais, para se apropriarem do seu “Esposendense”, e a razão que deu origem ao célebre prelo de madeira, (ver biografia de S. Vieira). Este episódio, espera-se, um dia será publicado na integra, para se chamar à atenção de que no século XX – Dezembro de 1994 – houve quem se aventurasse à apropriação de um jornal local (Jornal de Esposende), depois discutida a sua propriedade no Tribunal Judicial. Nunca alguém terá imaginado a audácia e o despótico gesto por quem tinha obrigação de respeitar a propriedade de um bem que era para todos os esposendenses. Foi vendido na Póvoa de Varzim.

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